Quantos donos de micro, pequenas
e médias empresas teriam a ousadia de contratar e manter nos seus quadros
alguém que não se conforma? Que tem ideias divergentes, que sugere
alternativas, algumas mais arriscadas outras, simplesmente, inovadoras?
E quantas multinacionais, já
agora, permitiriam que colaboradores (essa expressão tão falaciosa e cínica)
participassem na vida da empresa e no processo produtivo de forma autónoma, com
uma margem considerável de decisão?
É que o ser criativo não se
coaduna, para muita gente, com a visão do ser produtivo. E é pena!
Vivemos numa sociedade em que a
palavra “criativo” quase se banalizou. Para tudo temos que ser criativos, seja
para funções em que se apela, de facto, a um lado mais criador, ousado, como é
o caso dos trabalhos ligados às artes, publicidade, etc.; seja no mundo digital,
em que de cabeças revolucionárias nascem start-ups que, de vez em quando, acabam
até por influenciar as nossas vidas; seja ainda no trabalho quotidiano, nas
relações profissionais, na repartição, na escola, no instituto, na empresa, em
que a criatividade surge, à cabeça, como um predicado, uma qualidade. Mas na
prática não o é. Não porque não tenha em si a alavanca para a mudança,
crescimento e eficiência, mas porque o mercado não está preparado para pessoas
criativas. Para pessoas que digam o que pensam, que não tenham problemas em
mudar, em fazer diferença, em colocar em causa o modus operandi.
O apelo à criatividade no mercado
de trabalho surge como uma característica que fica bem colocar no anúncio de
emprego, que parece pertinente exigir ao novo trabalhador, mas que não passa de
um ardil. Para muitos empregadores a criatividade começa e acaba naquilo que
lhes interessa: no exigir que o trabalhador seja criativo na hora de dar
resposta a mil e uma solicitações simultâneas; na hora de realizar um estágio
curricular (leia-se, fazer muito e depressa sem qualquer tipo de remuneração);
no segurar o próprio posto de trabalho, estando para isso recetivo a tudo
aquilo que a empresa lhe impuser, sem levantar ondas. Mas a isto não se chama
criatividade! Há nomes próprios consoante a nossa necessidade de adjetivar a
realidade que nos rodeia. E um criativo dificilmente se revela neste tipo de
contextos. Não tem espaço para crescer. Nem a empresa ou instituição têm espaço
para serem inovadoras e para acolherem pessoas com este perfil. E isto
levar-nos-ia a outras dissertações sobre o mercado de trabalho português, sobre
os empresários e gestores que temos, e o longo caminho a percorrer para que o
trabalho em Portugal tenha o mesmo valor e reconhecimento que em outros países da União
Europeia. Quem sabe num próximo post.

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